Órgão julgador: TURMA, Data de Publicação: DJe 12/06/2023, grifei).
Data do julgamento: 19 de dezembro de 2006
Ementa
RECURSO – Documento:7070046 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO ESPECIAL EM Apelação Nº 5019148-32.2021.8.24.0033/SC DESPACHO/DECISÃO MSC MEDITERRANEAN SHIPPING DO BRASIL LTDA interpôs recurso especial, com fundamento no art. 105, III, "a" e "c", da Constituição Federal (evento 27, RECESPEC1). O apelo visa reformar acórdão proferido pela 2ª Câmara de Direito Comercial, assim resumido (evento 16, ACOR2): APELAÇÃO CÍVEL. "AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS C/C PEDIDO DE DANOS MORAIS". TRANSPORTE MARÍTIMO. INSCRIÇÃO INDEVIDA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA. PRETENSA CONDENAÇÃO DA PARTE RÉ AO PAGAMENTO DE LUCROS CESSANTES. DESACOLHIMENTO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZOS CONCRETOS. MERA POSSIBILIDADE DE DANO QUE NÃO INDUZ À CONDENAÇÃO DA PARTE ADVERSA. DANOS MORAIS. TESE ACOLHIDA. DANO "IN RE IPSA", AINDA QUE A PREJUDICADA SEJA PESSOA JURÍDICA. RESTRI...
(TJSC; Processo nº 5019148-32.2021.8.24.0033; Recurso: RECURSO; Relator: ; Órgão julgador: TURMA, Data de Publicação: DJe 12/06/2023, grifei).; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:7070046 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
RECURSO ESPECIAL EM Apelação Nº 5019148-32.2021.8.24.0033/SC
DESPACHO/DECISÃO
MSC MEDITERRANEAN SHIPPING DO BRASIL LTDA interpôs recurso especial, com fundamento no art. 105, III, "a" e "c", da Constituição Federal (evento 27, RECESPEC1).
O apelo visa reformar acórdão proferido pela 2ª Câmara de Direito Comercial, assim resumido (evento 16, ACOR2):
APELAÇÃO CÍVEL. "AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS C/C PEDIDO DE DANOS MORAIS". TRANSPORTE MARÍTIMO. INSCRIÇÃO INDEVIDA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA. PRETENSA CONDENAÇÃO DA PARTE RÉ AO PAGAMENTO DE LUCROS CESSANTES. DESACOLHIMENTO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZOS CONCRETOS. MERA POSSIBILIDADE DE DANO QUE NÃO INDUZ À CONDENAÇÃO DA PARTE ADVERSA. DANOS MORAIS. TESE ACOLHIDA. DANO "IN RE IPSA", AINDA QUE A PREJUDICADA SEJA PESSOA JURÍDICA. RESTRIÇÃO INDEVIDA, POR 89 DIAS, DO NOME DA EMPRESA AUTORA NO SISTEMA SISCOMEX, MEDIANTE EXIGÊNCIA INJUSTIFICADA DE APRESENTAÇÃO DA VIA ORIGINAL DO CONHECIMENTO DE EMBARQUE (BILL OF LADING) PARA LIBERAÇÃO DA CARGA RETIDA PELA EMPRESA RÉ (CONDUTA JÁ RECONHECIDA COMO IRREGULAR NO ÂMBITO DOS AUTOS EM APARTADO). PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. ÔNUS SUCUMBENCIAL READEQUADO. HONORÁRIOS RECURSAIS INCABÍVEIS. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
Não houve oposição de embargos de declaração.
Quanto à primeira controvérsia, pela alínea "a" do permissivo constitucional, a parte alega violação ao art. 373, I, do Código de Processo Civil, no que tange ao ônus da prova. Sustenta que caberia à recorrida "demonstrar os fatos constitutivos do seu direito", ônus que não teria sido observado nos autos.
Quanto à segunda controvérsia, pela alínea "a" do permissivo constitucional, a parte alega violação aos arts. 186 e 927 do Código Civil, ao argumento de que o reconhecimento de dano moral à pessoa jurídica exige a demonstração de efetivo prejuízo extrapatrimonial. Sustenta que (i) "o pleito de dano moral formulado pela recorrida, teve como fundamento a simples alegação de que o atraso na entrega de suas mercadorias importadas, ante o bloqueio inserido no Siscomex pela MSC após a descarga no porto de destino (em razão da falta de apresentação dos BLs originais), prejudicou a reputação da Bell Valley junto a seus clientes, o que seria comprovado através das notas fiscais de devolução (cancelamento de compras) colacionadas aos autos"; (ii) "o acórdão combatido utilizou o entendimento jurisprudencial de casos que tratam de situação totalmente específica de inscrição do nome da pessoa jurídica no cadastro de inadimplentes ou protesto indevido, matérias que, com o devido respeito, não possuem qualquer relação com o discutido nos presentes autos"; (iii) "a trava lançada no Siscomex é um mecanismo cuja única finalidade é impedir a retirada da mercadoria do recinto alfandegado, até que todas as obrigações perante o transportador marítimo sejam cumpridas, incluindo a comprovação de que a parte é a real proprietária da mercadoria, mediante a apresentação do BL original"; (iv) "a situação dos autos evidentemente não se enquadra na hipótese ventilada no acórdão em disputa, como inscrição indevida em cadastros de inadimplentes ou protesto indevido, posto que essas situações acabam por si só, gerando um prejuízo à reputação comercial e imagem da pessoa jurídica perante terceiros (ainda que presumido)". Aduz que, ainda que se considerasse indevida a restrição, não houve prova de abalo à reputação ou à imagem comercial da empresa.
Quanto à terceira controvérsia, pela alínea "c" do permissivo constitucional, a parte alega divergência jurisprudencial em relação à necessidade de comprovação de prejuízo extrapatrimonial para configuração do dano moral à pessoa jurídica. Sustenta que "o julgado em combate entende pela prescindibilidade da comprovação dos prejuízos extrapatrimoniais pela pessoa jurídica, sendo que a retenção da mercadoria seria suficiente para configuração do dano moral pretendido pela pessoa jurídica (prejuízo in re ipsa)". Por outro lado, afirma que decisões de outros tribunais entendem que o dano moral à pessoa jurídica não é presumível, sendo "imprescindível demonstrar os prejuízos extrapatrimoniais à pessoa jurídica e o seu vínculo com o caso concreto".
Cumprida a fase do art. 1.030, caput, do Código de Processo Civil.
É o relatório.
Considerando que a exigência de demonstração da relevância das questões federais, nos termos do art. 105, § 2º, da Constituição Federal, ainda carece de regulamentação, passa-se à análise da admissibilidade recursal.
Quanto à segunda controvérsia, verifica-se a presença dos requisitos necessários à admissão do recurso especial com fundamento na alínea "a" do permissivo constitucional. A decisão recorrida é proveniente de última instância; o recurso foi interposto tempestivamente, com preparo regular; há adequada representação processual; e a matéria foi devidamente prequestionada.
Alega a parte recorrente, em síntese, que o acórdão violou os arts. 186 e 927 do Código Civil, ao reconhecer a ocorrência de dano moral in re ipsa em favor de pessoa jurídica, sem a necessária demonstração de prejuízo extrapatrimonial. Sustenta que o bloqueio das mercadorias no SISCOMEX não se equipara às hipóteses de inscrição indevida em cadastros de inadimplentes ou protesto irregular, por se tratar de procedimento restrito às partes, incapaz de afetar a honra objetiva da empresa. Assevera, assim, que, inexistindo prova concreta de abalo à reputação ou à imagem comercial da recorrida, não estariam configurados os pressupostos da responsabilidade civil previstos nos dispositivos legais invocados (evento 27, RECESPEC1).
Sobre o assunto, destaca-se do voto (evento 16, RELVOTO1, grifou-se):
[...] é pacífica a jurisprudência no sentido de que o inscrição do nome no cadastro de inadimplentes ou protesto indevido, por si só, é apto a ensejar o reconhecimento do prejuízo, independentemente da produção de outras provas, uma vez que configurada a violação à honra objetiva. Tal repercussão negativa, inclusive, é plenamente capaz de gerar dano moral à pessoa jurídica, notadamente por comprometer sua credibilidade e reputação no meio social e comercial.
Confiram-se, a esse propósito, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSO CIVIL. CONTRATO. CERCEAMENTO DE DEFESA . INEXISTENTE. NECESSIDADE. REEXAME. SÚMULA Nº 7/STJ . DANO MORAL. PESSOA JURÍDICA. OCORRÊNCIA. INDENIZAÇÃO . 1. O sistema processual civil brasileiro é orientado pelo princípio do livre convencimento motivado, sendo permitido ao magistrado formar a sua convicção em qualquer elemento de prova disponível nos autos, bastando para tanto que indique na decisão os motivos que lhe formaram o convencimento, como ocorreu no caso dos autos. 2. Não há falar em cerceamento do direito de defesa, visto que o tribunal de origem, de forma fundamentada, resolveu a causa sem a produção de prova requerida pela parte em virtude da suficiência dos documentos dos autos . 3. Na hipótese, a intervenção do Superior Tribunal de Justiça quanto à relevância ou não de determinada prova e à valoração acerca da necessidade de sua produção demandaria o reexame do acervo fático-probatório, o que encontra óbice na Súmula nº 7/STJ. 4. No caso em apreço, o acórdão recorrido está em conformidade com o atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça de que, na hipótese de inscrição indevida em cadastro de inadimplentes, há dano moral in re ipsa, ainda que se trate de pessoa jurídica. Precedente. 5. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no AREsp: 2235389 SP 2022/0338270-1, Relator.: RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 05/06/2023, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 12/06/2023, grifei).
AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROTESTO INDEVIDO. PESSOA JURÍDICA. DANO MORAL IN RE IPSA . 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Nos casos de protesto indevido ou inscrição irregular em cadastro de inadimplentes, o dano moral se configura in re ipsa, mesmo que o ato tenha prejudicado pessoa jurídica. Precedente. 3. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt nos EDcl no AREsp: 1584856 SP 2019/0277043-3, Relator.: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 24/08/2020, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 31/08/2020, grifei).
[...]
Assim, diante da conduta ilícita perpetrada pela parte ré, ao promover a inscrição indevida do nome da empresa autora nos cadastros do sistema SISCOMEX com fundamento em débito já quitado (frete especificado no Bill of Lading), e tratando-se o caso de hipótese de prejuízo in re ipsa, resta configurada a responsabilidade civil do requerido, impondo-se o dever de reparação pelo prejuízos extrapatrimoniais sofridos pela requerente.
Na situação em exame, tendo em vista que o acórdão recorrido aplicou entendimento de dano moral in re ipsa próprio de situações de inscrição em cadastros de inadimplentes ou protesto indevido, sem considerar que o SISCOMEX "é o instrumento administrativo que integra as atividades de registro, acompanhamento e controle das operações de comércio exterior" (Decreto n. 660/1992), é apropriado admitir o recurso para que seja encaminhado à instância superior.
Uma vez que o recurso excepcional foi admitido com base em um dos seus fundamentos, torna-se desnecessária a análise das demais teses, as quais serão completamente devolvidas à apreciação do Superior Tribunal de Justiça.
Registre-se, ainda, que a parte recorrida requereu, em contrarrazões, a majoração dos honorários advocatícios recursais. Nos termos dos §§ 1º e 11 do art. 85 do Código de Processo Civil, a fixação da verba honorária em grau recursal é competência exclusiva do órgão jurisdicional encarregado do julgamento do mérito. Assim, considerando que a competência do Superior Tribunal de Justiça apenas se perfectibiliza após a admissão do recurso especial, mostra-se incabível a análise do pedido em sede de juízo prévio de admissibilidade. Nesse sentido: EDcl nos EDcl no AgInt no RE nos EDcl no AgInt nos EDcl no AREsp n. 2.333.920/SP, rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, j. em 29-4-2025.
Ante do exposto, com fundamento no art. 1.030, V, do Código de Processo Civil, ADMITO o recurso especial do evento 27, RECESPEC1 e determino a sua remessa ao colendo Superior Tribunal de Justiça.
Intimem-se.
assinado por JANICE GOULART GARCIA UBIALLI, 3° Vice-Presidente, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7070046v24 e do código CRC d90be355.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JANICE GOULART GARCIA UBIALLI
Data e Hora: 12/11/2025, às 16:49:35
5019148-32.2021.8.24.0033 7070046 .V24
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 16:14:32.
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